“Toma litros de café e escreve pequenos comentários e ideias para contos com sua melhor caneta-tinteiro em páginas brancas de um luxuoso caderno de notas. Às vezes, quando as coisas não vão bem, Emma se pergunta se o que acredita ser um verdadeiro amor pela escrita não seria apenas um fetiche por papelaria. Um verdadeiro escritor, um escritor nato, escreve palavras em sacos de papel, no verso de passagens de ônibus, na parede de uma cela. Emma não consegue se entender com nada que tenha menos de 120 gramas.”
Algumas vezes a identificação com um livro me assusta. Cada palavra, cada pensamento, cada ideia parece ter sido milimetricamente feita para você, naquele exato momento. E foi assim que me senti com a incrível história de Emma Morley e Dexter Mayhew. Em e Dex, Dex e Em.
Emma me encantou com a sua sinceridade, sua convicção e seus sonhos e se tornou até então minha personagem favorita. Tão simples, tão normal, e ao mesmo tempo tão forte e capaz, ela me fez devorar o livro e também acreditar mais em mim mesma, apesar da efemeridade da vida.
Após assistir ao filme há alguns anos, estrelado por Anne Hathaway e Jim Sturgess, adquiri o livro, mas confesso que ele ficou escondido na minha estante por um bom tempo, magicamente até a semana passada… Acontece que, trabalhando arduamente na minha meta de leitura de 2016, resolvi ressuscitar alguns livros dos mortos e eis que “Um Dia” me fisgou de um modo engraçado. Era a leitura que precisava fazer exatamente neste momento em que estou vivendo.
David Nicholls acertou no enredo da história, que traz um romance incrível, mas de forma realista: com as frustrações, as discussões, os ressentimentos, os sonhos corrompidos e buscas fracassadas, mas também as de sucesso, de pequenas e grandes coisas na vida de uma pessoa e também de um casal. A divisão dos capítulos dá um toque mais gostoso na leitura. Cada um se remete a um ano na vida dos personagens, especificamente nos dias 15 de julho, e a linha cronológica vai e volta no tempo, algumas vezes, fazendo com que a gente viaje na história de uma forma mais leve.
Os personagens principais se conheceram na faculdade, na década de 80, mas após a formatura trilharam caminhos diferentes, mantendo, é claro, um forte laço de amizade e de amor. Apenas alguns dias juntos foram suficientes para selar para sempre as duas vidas, que apesar de extremamente diferentes, conseguiram se manter unidas mesmo a distância, ao longo de vinte anos.
Emma e Dexter não são nem de longe o tipo de casal preferido dos romances. Na verdade, eles não têm absolutamente nada em comum, levam vidas diferentes e a encaram de forma diferente também, além de não serem tão lindos fisicamente e possuírem vários defeitos de personalidade, como o alcoolismo e a infidelidade, por exemplo. (O filme ajudou um pouco a mentalizar os personagens, confesso).
A verdade é que eu tenho uma séria queda por personagens escritores e, longe de me desfazer de Dex, mas a forma como Emma conquistou seus objetivos de vida me fez ter mais coragem para encarar os meus. Os seus pensamentos “o que você vai fazer com sua vida?” e “viver cada dia como se fosse o último”, ao final da história, revelaram claramente as intenções da personagem:
“Esse era o conselho convencional, mas na verdade quem tinha energia para isso? E se chovesse ou você estivesse de mau humor? Simplesmente não era prático. Era bem melhor tentar ser boa, corajosa, audaciosa e se esforçar para fazer a diferença. Não exatamente mudar o mundo, mas um pouquinho ao redor. Seguir em frente, com paixão e uma máquina de escrever elétrica e trabalhar duro em… alguma coisa. Mudar a vida das pessoas através da arte, talvez. Alegrar os amigos, permanecer fiel aos próprios princípios, viver com paixão, bem e plenamente. Experimentar coisas novas. Amar e ser amada, se houver oportunidade”.
Essa era a teoria geral de Emma Morley, uma grande reflexão e um invejável objetivo de vida, que se iguala um pouco ao meu. Vale ressaltar que este livro me fez chorar pra caramba, sonhar e acreditar mais em mim e no amor, e enxergar o verdadeiro caminho, pelo menos por agora.
“Mas em outros momentos ela se sente bem e escreve durante horas, feliz e sozinha em seu apartamento de quarto e sala, como se as palavras estivessem o tempo todo ali.”
Texto: Walquíria Domingues
Fonte: www.meninadeasas.com.br