O direito a igualdade, envolto também na vedação à discriminação, é instrumento solidificado no âmbito jurídico interno e internacional como inerentes à vida com dignidade, tanto assim que a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 em seu artigo II.1 pontua que “Todo ser humano tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição”.
O preconceito e a estigmatização, todavia, constituem realidade absoluta em qualquer lugar do globo pelos mais diversos motivos, inclusive a idade.
Os avanços médicos e tecnológicos, inegavelmente, acarretaram um envelhecimento da população global. Lado outro à mudança brusca no cenário, o direito das pessoas idosas, rotineiramente, passa despercebidos e, ainda que existam inúmeras teorias humanitárias de proteção às pessoas maiores de 60 (sessenta anos), a regra é a invisibilidade do idoso perante a sociedade e a família.
Noutro giro, ainda que idosos, homens ou mulheres, enfrentem graves violações de direitos humanos, pouquíssimos mecanismos internacionais têm dedicado atenção às questões específicas deste grupo.
Pela experiência na administração pública, em especial na área da saúde, podemos afirmar, com precisão, que o problema é bem maior do que parece. O descaso com os idosos está longe de ser restrito à inércia ou ineficiência públicas. Em alguns casos, que não são poucos, é necessário, após alta médica, que o Estado recorra ao judiciário para intimar a família do paciente para buscá-lo no hospital. Alguns destes casos, infelizmente, originam inquéritos a motivar a requisição de documentos médicos pelo Ministério Público para apurar, dentre outras, a prática de maus-tratos pela própria família do paciente.
Seja pela publicidade do tema ou pelo aumento na incidência de atos discriminatórios em público, na ceara das Nações Unidas, o tema das violações aos direitos dos idosos vem ganhando certo protagonismo. Todavia, pela intragável violação aos Direitos Humanos, a timidez com que se debate ou normatiza o tema chega a irritar.
A condição humana garante abrangência da proteção do idoso na sistemática internacional de proteção da pessoa, impedindo, em tese, a inércia estatal frente a situações discriminatórias, senão vejamos: “Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei.
Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação” (art. VII Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948).
Noutro giro, conforme ensina a professora Flávia Piovesan, “embora esses instrumentos internacionais sejam aplicáveis aos idosos da mesma forma que a toda e qualquer pessoa, suas especificidades são inviabilizadas e por vezes desconsideradas no enfoque da promoção dos direitos humanos de forma geral e abstrata. Daí a relevância de um instrumento internacional juridicamente vinculante que trate das questões específicas dos direitos humanos das pessoas idosas no sistema da ONU”.
A Constituição Federal de 1988 reconhece a proteção e o amparo do idoso, estabelecendo multi-resposabilidade social, segundo a diretriz que “a família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida” (art. 230 CF/88).
As pessoas idosas não formam um grupo homogêneo, variando suas experiências, suas idades e pluralizando os estigmas sociais. A população entre 60, 70, 80 ou 90 anos enfrenta estereótipos e desvantagens sociais, econômicas e, na mesma lógica, não possuem qualquer representatividade.
No Brasil a discriminação e a violência contra o idoso alcança índices alarmantes. A exemplo, segundo estudo encomendado pelo Bradesco, dos brasileiros com idade entre 55 e 73 anos, 39% (trinta e nove por cento) afirma ser ou ter sido vítima de discriminação por causa da idade. Quanto ao gênero, as mulheres, segundo a pesquisa, são mais desrespeitadas (44% delas).
Segundo José Carlos Libâno, cientista responsável pelo estudo, a solução do problema passa pela civilidade. “A sociedade terá de ser educada para isso”.
É fundamental, pois bem, considerar as diferenças na elaboração e implementação de normas jurídicas adequadas, de forma a garantir, via individualidade, a igualdade de fato para todas as pessoas idosas, primando por sua dignidade e inclusão.
Por fim, ousamos discordar de Libâno. Acreditamos não ser possível educar uma sociedade para respeitar determinado grupo. Uma sociedade que agride e violenta seu idoso é uma comunidade corrompida e carente de educação; não de educação para com o idoso, mas educação na sua integralmente.
Hugo Viol Faria
Graduado em Direito pela Faculdade Metodista Granbery – FMG. Pós-graduando em Ciências Criminais pelo Complexo de Ensino Renato Saraiva-Estácio. Advogado. Gerente de Apoio Jurídico da Advocacia Geral do Município de Barbacena/MG. Membro da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil Subseção Barbacena/MG. Professor de Direitos Humanos e Prática Penal.